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Simplificando a vida

Eu tinha 8 anos quando passei batom pela primeira vez. Escondida da minha mãe, que batia o pé dizendo que criança tinha que ser criança, apliquei o batom de tom amarronzado, típico dos anos 1990 e me senti linda. Naquela época já acordava cedo antes de ir à escola para arrumar os cabelos e, como usava uniforme, caprichava nos acessórios. Conforme os anos foram seguindo, passei a acordar cada vez mais cedo já que o cabelo era rebelde e fazer escova tomava um bom tempo, também era preciso verificar se nenhum pelo da já ultra-depilada sobrancelha estava fora do lugar.

Assim fui me rendendo mais e mais aos rituais de beleza que #8211; segundo aprendi #8211; garantiam que eu fosse bonita e feminina. A autoestima não era lá essas coisas, tinha orelhas de abano que minha professora de balé grudava na cabeça com cola, usava aparelho nos dentes desalinhados, precisava de óculos de grau e lidava com um fios que teimavam em dular. Tudo indicava que meu maior predicado deveria ser a inteligência. Sabe como é, em cidade do interior de Santa Catarina ou se tem 1,75m com olhos claros ou se aceita que nem a faixa de Miss Simpatia será sua.

Quando entrei na faculdade, um novo mundo se abriu e conheci gente de todo jeito. Aceitei o cabelo crespo, depois cortei à Chanel, depois mais e mais curto. Encontrei meu rosto e até que não era mau! As orelhas incomodavam ainda, mas com um truque no cabelo dava para disfarçar.

Comecei a nadar, conheci atletas de corpo perfeito. Eu treinava muito, mas não importava quantos quilômetros eu completasse ao dia, o corpo não ajudava. Fui ao médico, “só com lipo” ele asseverou. Desisti, era estagiária, não tinha grana. Admirava aquelas mulheres com gomos na barriga e músculos na coxa que eu nem sabia que existiam. Eram triatletas, treinavam umas 4 horas ao dia, só assim para conseguir aquela coxa. Eu era universitária e estagiava em 2 lugares, melhor me conformar.

Quando conheci a noite de to Alegre, a sensação era de finalmente me sentir em casa. Era início dos anos 2000 e tinha gente de todo jeito: com cabelo, sem cabelo, tatuada, colorida, descolada, punk, rasta, black power e até… comum, todos convivendo no mesmo espaço. Fiquei encantada.

Passei a ter cabelos de todas as cores e jeitos, acompanhados por delineado gatinho imenso. Era divertido. Descobri que eu não precisava ser linda como as loiras de Santa Catarina ou as atletas do triatlo. Descobri cores, texturas, modelagens e maquiagens. Gastei muito, acumulei horrores, criei um , conheci gente.

Os 30 chegaram e após duas décadas acordando cedo para parecer impecável para a sociedade, cansei. Fiquei “relaxada” segundo minha mãe. Cortei o cabelo do jeito mais curto que pude convencer o cabeleireiro, tratei da pele e agora praticamente só uso maquiagem nos olhos e o inseparável batom, meu amor.

A sociedade não aprovou a mudança. #8220;Uma mulher de cabelo tão curto só pode ter algum problema!”
“Está doente?” pergunta um aqui. Ali, uma conhecida segura minha mão com lágrimas nos olhos e questiona sobre a quimio. Adiante escuto uma piadinha sobre salvar o cabelo antes dele derreter de tanta química. #8220;Já sei! Quer engravidar!” alguém tenta adivinhar.

Interessante como buscamos explicações complexas para algo fácil: estou simplificando. Cabelo prático de cuidar, maquiagem rápida de fazer (e só quando eu estou a fim), looks confortáveis, boa parte de brechó. Semana passada até arrisquei usar sandália sem salto em um casamento.

Ainda amo moda, sapatos de salto, cabelos e maquiagem. Mas agora uso quando eu quero e não quando a sociedade acha que eu devo. Ainda tenho muitos excessos para deixar para trás. Não para conquistar os sonhados gomos na barriga, mas para me libertar de coisas que só ocupam espaço e não preenchem a alma.

E as orelhas? Elas continuam no mesmo lugar que sempre estiveram, provavelmente até maiores do que na época em que minha professora as colava, mas agora eu as amo e enfeito com brincos enormes.

Negar quem a gente é, sufoca, desgasta, dói e sai caro. Nenhuma roupa ou maquiagem vai lhe fazer se sentir bonita enquanto você tentar se encaixar na moldura que os padrões de beleza querem impor. Aceitar-se é o passo para trabalhar aquilo que é necessário mudar lá dentro e que vai lhe fazer linda de verdade. Só assim seremos melhores para nós, para quem amamos e para o mundo.

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Fonte: Blog De repente Tamy

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